Pesquisadora inicia estudos aos 9 anos e hoje é mestre pela Ufal
Conheça a história da jovem que apostou todas as fichas na educação
Por Myllena Diniz – estudante de Jornalismo ( Ufal )
Exemplo de superação, Márcia Ferreira revirou o destino pelo
avesso e encontrou na educação o norte para a sua trajetória pessoal e
profissional. Desde o primeiro dia em que colocou os pés numa sala de aula, aos
9 anos de idade, a alagoana coleciona sonhos que a levaram ao mestrado em
Diversidade Biológica e Conservação dos Trópicos, na Universidade Federal de
Alagoas.
A paixão pelos livros acompanhou a garota, natural de Craíbas,
município do Agreste de Alagoas, até seu ingresso na Universidade, em 2007. Logo,
o encantamento transformou-se em amor pela ciência, sempre aliado a seu esforço
e sua dedicação. A licenciatura em Biologia sempre foi seu sonho, mas para
realizá-lo a professora enfrentou uma maratona de obstáculos: das condições
precárias da vida rural à dificuldade de acesso ao ensino superior.
Do campo para a cidade
Márcia Ferreira vem de uma família de agricultores assalariados
e conhece, de perto, a realidade do campo. "Eu sempre sonhei em sair da
roça, para não depender da chuva para ter dinheiro e comida dentro de casa;
deixar de ter as mãos calejadas; e ter condições de suprir as necessidades dos
meus familiares", destacou.
Para a licenciada em Biologia, a Universidade sempre foi o
caminho sonhado para a transformação da vida da sua família. "Muita gente
dizia que filho de pobre não podia fazer faculdade, mas eu sabia que
conseguiria, porque o bom da vida é sonhar. Quando chegou ao interior, a Ufal
transformou a realidade de muita gente, como foi o meu caso", relembrou.
A pesquisadora soube aproveitar todas as oportunidades que a
instituição ofereceu, como o auxílio estudantil – útil para suprir despesas com
fotocópias, livros e passagens de ônibus. Sem renda suficiente para realizar a
inscrição do vestibular, Márcia também ficou isenta da taxa cobrada aos
candidatos e, para ingressar no Campus Arapiraca, estudou rigorosamente, como
fez durante toda a vida escolar.
"A energia só chegou a minha casa em 2005. Antes disso, eu
estudava sob a luz do candeeiro. Apesar de desgastar a minha vista, eu não perdia
o foco... Como a universidade sempre foi a minha meta, eu lia tudo o que
aparecia", revelou Márcia.
A persistência é uma das suas principais características. No
ensino fundamental, após dias inteiros de trabalho na roça, ela caminhava seis
quilômetros, à noite, para chegar até a escola. No ensino médio, a caminhada
passou a ser de quatro quilômetros até o ponto de ônibus. Na graduação, o
percurso tornou-se ainda maior.
"Eu caminhava ou pedalava três quilômetros até a pista que
ligava Craíbas aos municípios vizinhos. Depois, pegava um ônibus para
Arapiraca, onde eu pegava outro transporte coletivo até o campus. Na volta, eu
refazia esse roteiro até chegar em casa", detalhou.
Excelência acadêmica
Apesar das dificuldades, Márcia encarou a vida acadêmica com
dedicação e excelência. No final de 2010, antes de concluir a graduação, foi
aprovada para o mestrado em Diversidade Biológica e Conservação dos Trópicos,
do Instituto de Ciências Biológicas (ICBS) do Campus A.C. Simões, em Maceió. Já
na capital alagoana, a pesquisadora – que só conheceu o mar aos 21 anos –
desenvolveu seus trabalhos no Laboratório de Ciências Marinhas (Labmar),
situado no Museu de História Natural (MHN), que tem vista para a orla da
Pajuçara.
"Hoje, eu trabalho vendo o mar e em contato direto com os
peixes. Eu consegui muita coisa por meio da Universidade... Para muitas
pessoas, isso pode não ter significado especial, mas é muito importante para
mim. Eu represento o contrário da frase 'filho de pobre não faz faculdade'. Não
é fácil, mas é possível", ressaltou Márcia.
Além de ter acesso ao ensino superior, a estudiosa construiu uma
trajetória respeitável na pós-graduação. Com pesquisas sobre a idade de
crescimento de tainhas da Lagoa Mundaú, Márcia conquistou o 3º lugar em
excelência acadêmica no Encontro Brasileiro de Ictiologia (EBI), realizado em
fevereiro deste ano, em Olinda-PE. Ela também teve trabalho reconhecido no
Encontro Nordestino de Zoologia, em 2011.
A passagem pela Universidade também rendeu à Márcia a primeira
viagem de avião, com destino a Argentina. Na ocasião, a pesquisadora foi
contemplada com um curso no país vizinho e auxílio da Ufal. Se a terra já era
uma velha conhecida e o mar deixou de ser um estranho, seria o céu o limite
para essa jovem pesquisadora?
Superação
As conquistas de Márcia têm sido um estímulo para os jovens de
Craíbas, em especial para seus oito irmãos. Ainda repleta de sonhos e focada na
carreira, a pesquisadora já reconhece as conquistas obtidas nos últimos anos.
"Minha história é de uma pessoa que venceu. Eu me sinto
realizada, porque tudo foi muito difícil. O meu ingresso na Ufal foi motivo de
orgulho para toda a família, eu passei a ser uma referência. Hoje, posso dizer
que sou a primeira a ter um salário e a primeira graduada da minha família",
salientou.
Fora de sua cidade natal, a pesquisadora também é referência
para outros jovens. Em outubro de 2014, Márcia Ferreira voltou ao Campus
Arapiraca, para ministrar minicurso sobre Ecologia dos Peixes, destinado a
estudantes de licenciatura em Biologia. Segundo Márcia, regressar à
Universidade como palestrante foi um dos momentos mais marcantes de sua vida.
"Foi uma emoção danada! É muito bom saber que já estive
sentada naquelas cadeiras, como estudante, e voltei como profissional",
refletiu.
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